segunda-feira, 21 de fevereiro de 2011

A intolerância com Rosalba e os vícios de nossa cultura política

Do mestre Carlos Santos

A tradição republicana norte-americana desde Abraham Lincoln, ou mesmo a partir de George Washington, é parcimoniosa com o agente público, em seus primeiros meses de gestão. Não se trata de leniência.

 
É algo não convencionado ou positivado em lei. Está no ar, como uma das marcas de sua cultura política, que no século 18 converteu estados dispersos numa federação uníssona, não obstante tantas diferenças regionais.


A própria imprensa, de larga tradição pluralista e democrática, contribui para que os gestores tenham uma relativa "folga" à arrumação da casa, até serem questionados de forma mais contundente. Os resultados, é bom grafarmos e sublinharmos, são cobrados de forma cívica pelo próprio cidadão.

 
E entre nós, brasileiros e potiguares, como funciona essa relação entre sociedade e poder, nos primeiros meses de uma gestão?

 
Tenho dito, repetido com considerável regularidade, que somos uma civilização em formação, uma sociedade em busca da própria identidade; em dúvida se transplanta modelos ou se resolve se aceitar como é.

 
Somos um povo, como dizia o professor Darcy Ribeiro, que deve se orgulhar de ser "inventivo, miscigenado e tropical". O que não nos impede, claro, de adaptarmos à nossa realidade, o que funciona bem além das fronteiras nacionais.

 
Oliveira Vianna, no clássico "Intituições políticas brasileiras" (1949), trabalho de sociologia política, revela o intrincado ambiente de formação antropológica-sociológica do Brasil. Os reflexos desse mosaico chegam aos nossos dias. Incide sobre o que testemunhamos na relação entre o ente público e a sociedade civil.

 
Ele é suplementado (ou superado), com maestria, por Raymundo Faoro, no denso "Os donos do poder - Formação do Patronato Político Brasileiro". Vícios importados da metrópole, Lisboa, continuariam impregnados em nós - teoriza o autor.

 
A pressa por resultados, por exemplo, é um deles. Há um açodamento para que o gestor público mostre obras e mais obras. Um jeito São Tomé de ser: "ver para crer".

 
No caso específico da governadora Rosalba Ciarlini (DEM), não é diferente. Contudo existem sinais de intolerância, passionalidade e traços de má-fé política, na exigência de que apresente rápidos resultados a partir do seu gabinete na Governadoria.

 
A tradição na América, de se estipular pelo menos 100 dias para início de avaliações e cobranças, ao gestor, é de certo modo "xerocada" no Brasil. Com Rosalba, não.

 
As primeiras greves do serviço público, declarações de opositores e cobranças de segmentos da mídia querem o preto no branco. Já! Ela se defende com o uso do velho truque do complexo da transferência de culpa.

 
Aponta que recebeu um estado falido.

 
Dificuldades

 
É visível que temos dificuldades. Elas pesam sobre a nova administração, obrigada a gerir o passado, antes de pensar no presente. Mas lembremos que o governo é impessoal e o cargo da governadora implica na gestão de problemas.

 
A propósito, se não existissem imbróglios, não precisaríamos dela ou de outro gestor. Tudo andaria de forma autônoma.

 
Do outro lado, é que talvez esteja existindo algum tipo de excesso de cobrança, de apelo por resultados rápidos. Esse quadro é que me parece incomum.


Pródiga em copiar o que se faz lá fora, a sociedade precisa repensar o cerco feito ao governo de Rosalba Ciarlini. Ao mesmo tempo, a governadora não pode se sustentar no discurso-chavão da "herança maldita" para apenas se defender, imobilizada na própria cadeira de trabalho.


Criar novas secretarias, doar dinheiro para Carnaval e lotear o poder por critérios meramente políticos, também não ajudam a dissipar a impaciência alheia.

 
Enfim, mas tudo faz parte de nosso jeito ainda primitivo de fazer política e administrar o bem público. Sombra e água fresca, só mesmo no Senado, o "céu" de Darcy Ribeiro.